quinta-feira, 3 de março de 2011

Imagens do tempo

Dentre as vívidas e coloridas lembranças que trago, gosto, especialmente, das imagens em preto-e-branco de meu pai. Não sei ao certo se são lembranças ou resquícios visuais das velhas fotos, tantas vezes vistas nos álbuns. Álbuns que minha mãe confeccionava com tanto zelo, escrevendo abaixo a história de cada um daqueles momentos, como ninguém. Anos mais tarde, eu mesma quis reproduzir alguns desses álbuns. Confesso que não tive fôlego nem paciência.

Na minha infância, muitas vezes, em algumas tardes chuvosas - como a de hoje - , minha mãe preparava chá e ficávamos por horas vendo as fotos e ouvindo as histórias daquelas pessoas, personagens de nossa família.

Meu pai aparecia pouco, mas as fotos mais bonitas são aquelas capturadas do passado, da sua juventude, com o seu alinhado terno claro. Essas fotos estampam uma alegria e uma juventude que o tempo levou embora. É curioso ver o passado e constatar hábitos antigos, costumes de uma época, trejeitos que não se conhecem mais.

Os sonhos retratados daquelo moço, cheio de amigos, que saía em turma e registrava aqueles momentos para a posteridade, ainda estão intactos. Bem desgastados, é verdade, mas a emoção que as fotos guardam quase pode ser tocada. Os olhos são os mesmos, o semblante, o sorriso. Memória viva de uma época que passou.

Muito tempo se passou. Uma vida inteira se passou, mas aquele rapaz de terno e gravata, cabelos alinhados, estará pra sempre me sorrindo numa foto em preto-e-branco. E quando eu olhar fotografias antigas, em algumas tardes chuvosas - como a de hoje - , vou me imaginar viajando para o passado e para o futuro. Tudo fica um pouco misturado: o futuro daquele passado, que é o hoje; o passado daquele futuro, que também é hoje; e a mescla disso tudo.  E além de me distrair, passar o tempo, posso refletir sobre as lições de meu pai. Lições que, certamente, nem eu nem ele sabíamos existir. Lições de Caetano Veloso, lições do tempo, do tempo de todos nós. 

  
"És um senhor tão bonito
Quanto a cara do meu filho
Tempo tempo tempo tempo
Vou te fazer um pedido
Tempo tempo tempo tempo...

Compositor de destinos
Tambor de todos os rítmos
Tempo tempo tempo tempo
Entro num acordo contigo
Tempo tempo tempo tempo...

Por seres tão inventivo
E pareceres contínuo
Tempo tempo tempo tempo
És um dos deuses mais lindos
Tempo tempo tempo tempo...

Que sejas ainda mais vivo
No som do meu estribilho
Tempo tempo tempo tempo
Ouve bem o que te digo
Tempo tempo tempo tempo...

Peço-te o prazer legítimo
E o movimento preciso
Tempo tempo tempo tempo
Quando o tempo for propício
Tempo tempo tempo tempo...

De modo que o meu espírito
Ganhe um brilho definido
Tempo tempo tempo tempo
E eu espalhe benefícios
Tempo tempo tempo tempo...

O que usaremos prá isso
Fica guardado em sigilo
Tempo tempo tempo tempo
Apenas contigo e comigo
Tempo tempo tempo tempo...

E quando eu tiver saído
Para fora do teu círculo
Tempo tempo tempo tempo
Não serei nem terás sido
Tempo tempo tempo tempo...

Ainda assim acredito
Ser possível reunirmo-nos
Tempo tempo tempo tempo
Num outro nível de vínculo
Tempo tempo tempo tempo...

Portanto peço-te aquilo
E te ofereço elogios
Tempo tempo tempo tempo
Nas rimas do meu estilo
Tempo tempo tempo tempo..."


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